Reproduzo abaixo um texto que gostei muito. O autor é Carlos Pinduca, guitarrista da excelente banda Prot(o), de Brasília-DF. O motivo é um só - a originalidade do que ele escreveu. Quantas e quantas vezes já lemos sobre música em jornais e nas famigeradas "revistas eletrônicas" (que se reproduzem como apanhadores em campos de centeio), que mudam somente os nomes das bandas, mantendo uma espécie de texto-padrão como base? Claro, o texto-padrão cita a "pérola-pop" que a banda indie compôs e que deveria tocar em todas as rádios, se o jabá não existe e se o mundo fosse perfeito, composto de músicas beatle com letras dylan. Algo assim.
Algumas bandas exageram na influência, e mantêm apenas uma única luz no início do túnel. E aí são chamadas de imitadoras, de bandas-chatas. Claro, não é sempre assim. O ideal é citar o "caldeirão de influências do qual tiramos nosso próprio som". Nossa.
Não concordo com tudo que o Pinduca escreveu. Radiohead é sempre chato, seja original ou não. Thom Yorke é insuportável e tem cara de personagem de desenho animado de algum daqueles canais da Sky. Ou da Net, não sei. Bom, acho que os canais são os mesmos. E eu gosto é de Wilco. Que imita um pouco o povo antigo da folk music. E é ótimo.
"Quando uma ótima banda se torna uma péssima influência
Radiohead: experimentais que geraram seguidores caretas Algumas filosofias orientais acreditam que toda ação carrega em si uma carga de bem e de mal. É um tipo de pensamento que busca enxergar por trás das aparências e dos efeitos imediatos de um ato, analisando desde as reais intenções existentes ali até suas conseqüências a longo prazo e a longas distâncias. De tão intrincada e ampla, essa visão holística de mundo chega a apostar que o bater das asas de uma borboleta no Japão pode influenciar a vida de um cidadão no interior do Mato Grosso. Ou seja, por mais que a nossa boa intenção seja apenas a de conter um vazamento de um cano d’água, podemos, sem saber, estar ajudando a romper as comportas de uma grande represa.
A princípio, um assunto tão místico como esse estaria a léguas de distância do cético e materialista rock’n’roll. Mas, analisando um pouco a história do gênero, notamos que o princípio de bem e mal em uma mesma ação também se aplica ao estilo musical criado por Chuck, Elvis e Richards nos anos 50. E isso faz com que bandas excelentes, algumas até mesmo responsáveis pela ruptura de barreiras em determinadas épocas, sejam exatamente os entraves de outros momentos, por meio de uma influência nefasta em grupos absolutamente sem talento.
Os discípulos de Rolling Stones se ativeram à atitude cafajeste
da banda, em detrimento da boa música
O Rolling Stones é um desses exemplos de banda legendária, que, em contrapartida a sua inegável competência musical, ajudou a criar alguns dos piores monstros - no mau sentido - do rock. Basta ouvir vários grupos de hard rock e glam dos anos 70 e “rockões cafajestes” dos 80’s, que, inspirados pela atitude “bad boy” e o lado pesado da banda de Mick Jagger e Keith Richards, conseguiram a façanha de tornar o rock’n’roll um estilo quase... brega. No Brasil, muitas bandas seguiram essa tendência, como os setentistas do Tutti-Frutti e do Made in Brazil e os oitentistas do Barão Vermelho e do Garotos da Rua, alguns deles fazendo sua música até com certa competência. Mas, no geral, o resultado das bandas influenciadas por Stones é aquém do aceitável, com um rock previsível, de letras quase infantis de tão mal escritas, e componentes vestidos com jaqueta de couro preto e mullets de causar náusea em qualquer pessoa minimamente ligada em estética.Uma outra excelente banda que gerou filhotes indesejáveis é o Van Halen. Liderada por Eddie Van Halen, um gênio da guitarra tanto em técnica quanto em bom gosto, o VH acabou ajudando a disseminar o que se convencionou chamar de Metal Farofa, com grupos formados por componentes muito ligados ao virtuosismo (e ao visual bizarro de roupas coloridas e cabelos com laquê!!!), mas pouco inspirados. Quer exemplos? Mr. Big, Tesla, Poison, Extreme, White Lion e por aí vai. A cena formada por bandas “poser” e guitarristas super técnicos – apelidados de “punheteiros” – se tornou tão popularmente grotesca no final dos anos 80 e começo dos 90’s, que o próprio Van Halen saiu com filme queimado da história, numa daquelas injustiças que o futuro há de reverter. Mas a lista de bandas excelentes que serviram de influência para péssimos grupos não pára por aí. De cabeça, posso lembrar de U2 e sua escola de bandas que tentavam ser, ao mesmo tempo, pop e engajadas. Na maioria das vezes, o que se via nos aspirantes a U2 era um discurso político baseado em argumentos fracos e uma música pobre, longe da classe e força propagada pela turma de Bono Vox e The Edge. Outra banda excelente - quase revolucionária - que gerou rebentos chatérrimos é o Radiohead. Por algum motivo, seus filhotes optaram por deixar de lado a inteligência e o lado experimental da banda de Thom Yorke, para se apegar a uma música melosa e arrastada. Talvez o exemplo de rebento do Radiohead (e do U2, também) mais bem sucedido – e chato, na opinião deste que vos escreve – seja a banda inglesa Coldplay. Mas há outros seguidores meio pentelhos que vão desde Howie Day até (o competente, mas meio “over”) Muse. No Brasil, dois grupos muito bons exerceram péssima influência sobre suas crias: Chico Science & Nação Zumbi e Los Hermanos. Enquanto o primeiro foi responsável pela proliferação de diversos grupos pseudo-folclóricos nas décadas de 90 e 00, apegados superficialmente a tambores e supostas raízes brasileiras, a banda dos barbudos cariocas fez com que um monte de gente achasse que a fórmula da boa música era simplesmente resgatar velhos discos de MPB dos pais e tentar escrever como Chico Buarque. Obviamente, a esmagadora massa de bandas seguidoras dos Los Hermanos acabaram com letras falsamente poéticas e harmonias e arranjos metidos a rebuscados e abrasileirados. O resultado, na maioria das vezes, é uma verdadeira lástima.
Pearl Jam: hors-concours na influência a bandas péssimasPor último, mas não menos importante, talvez a banda hors-concours em matéria de ser uma péssima influência para as demais é o Pearl Jam. O lado messiânico e pop de Eddie Vedder e seus asseclas criou alguns dos conjuntos mais insuportáveis da história do rock. Basta lembrar de bandas como Nickelback, Creed, Nixon, Hootie & the Blowfish e tantas outras que acharam que bastava imitar o vocal de pato rouco de Eddie Vedder para se fazer sucesso. No meio disso, só uma banda se salvou: o Stone Temple Pilots, que, de clone do PJ, acabou partindo para outras searas e se tornando uma ótima banda.Num caminho oposto à popularidade, são as bandas mais obscuras que, geralmente, acabam sendo as melhores influências na história do rock. E é por isso que artistas como Muddy Waters, Link Wray, Buddy Holly, Velvet Underground, New York Dolls, Stooges ou mesmo os alemães do Can acabaram sendo as grandes referências para o surgimento de bandas excelentes e até mesmo de movimentos musicais. Uma das explicações para isso talvez seja o fato de os artistas obscuros só serem procurados por gente mais ligada em música, que está tentando escapar das fórmulas fáceis do sucesso. Por outro lado, jogar a receita de se fazer uma boa banda para esse lado alternativo seria muito simplista. E, convenhamos, muita coisa boa já foi feita em cima de Beatles, Bob Dylan, Talking Heads e tantos outros medalhões do rock - os Stones mesmos foram quase xerocados pelo Primal Scream no começo de carreira -, enquanto muita porcaria já foi influenciada por bandas underground como Pixies e Pavement.
Na verdade, talvez a resposta para essa questão da influência maléfica de bandas boas esteja num plano mais esotérico, mesmo. De alguma forma, em determinadas épocas, alguns artistas excelentes chamam a atenção para a forma como fazem música e passam a servir de matriz para as bandas ruins - as quais, por sua vez, acreditam serem capazes de refazer facilmente aquela fórmula de sucesso. Quase como se fosse um carma, essas bandas ruins vêm trazer à prova o benefício causado à música pelos bons artistas em sua carreira pregressa, numa espécie de balanceamento entre o que seria considerado bem e mal em uma mesma ação."